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A economia e as expectativas

  • Igor Paim
  • 7 de ago. de 2017
  • 4 min de leitura

Nós economistas, durante as variadas análises que fazemos, utilizamos inúmeras técnicas e ferramentas que nos auxiliam a observar tanto o que está acontecendo quanto o que possivelmente está por vir. Em tais análises, por mais que vejamos números, gráficos e expressões matemáticas, na realidade estamos tentando traduzir e tornar observável a única coisa que realmente faz a economia girar: a ação humana.

Tendo isso em mente podemos imaginar como pode ser, por vezes, intragável tentar imaginar como um grupo de seres humanos poderá se comportar em um futuro próximo. Irão consumir mais ou menos? Irão investir? Porque não querem trabalhar em determinado setor?

O ser humano possui sentimentos fortes e isso muitas vezes o torna imprevisível, mas também possui hábitos e padrões. Tudo isso interfere na forma como ele vê o mundo, e a forma como ele vê o mundo interfere na maneira como ele interfere na economia. Todo o ser humano, por mais apegado que seja a viver o presente, pensa um pouco no futuro, espera por algo, cria expectativas.

Em seus trabalhos clássicos, Keynes já abordava o tema, porém as expectativas viraram o centro de debate entre os anos de 1970 e 1980, com os Monetaristas e depois com os Novos Clássicos[i]. Desde então tornou-se crucial saber o que os agentes econômicos estão esperando para o futuro. Expectativas de renda, consumo, investimento, inflação, além de outros, ajudam às políticas fiscal e monetária a serem balizadas.

As expectativas de inflação, por exemplo, são extremamente importantes para que a autoridade monetária tome suas decisões sobre política monetária. Aqui no Brasil o Banco Central possui o Sistema de Expectativas de Mercado[ii], implementado em 1999, quando do início do Regime de Metas de Inflação. Neste sistema, instituições do setor financeiro e do setor real da economia fazem suas projeções para algumas variáveis e as cadastram no sistema diariamente. Tais dados são recebidos pelo Banco Central e disponibilizados ao público semanalmente, por meio do relatório Focus.

Mas porque disponibilizar tais dados? Segundo Mishkin e Bernanke (1997), o Regime de Metas de Inflação requer comprometimento e transparência por parte da autoridade monetária. Além disso, se levarmos em consideração a interpretação de Kydland e Prescott (1977), onde a inflação é, em parte, a desconfiança dos agentes no governo, a expectativa de inflação pode ser considerada como um medidor de credibilidade do Banco Central, ou seja, se a expectativa é de aumento da inflação, isso quer dizer que os agentes não estão confiantes na manutenção do comprometimento do Banco Central com a meta.

Agora, vejamos o histórico brasileiro de expectativas de inflação:

Fonte: Elaboração própria com dados do Sistema de Expectativas de Mercado.

Perceba que entre 2009 e 2015 as expectativas tiveram crescimento constante, e considerando que esta variável como um medidor de credibilidade do Banco Central, podemos dizer que nesse intervalo de anos a credibilidade da autoridade monetária teve queda constante.

Existem vários motivos para tal desconfiança dos agentes, dentre elas, podemos citar a aparente interferência da (ex) presidente da república na condução da política monetária. Porém, além disso, podemos citar alguns fatos históricos que poderiam gerar desconfiança nos agentes:

  • Pouca idade do Bacen: O Banco Central do Brasil foi criado em 1964 (53 anos), enquanto outros bancos centrais possuem mais de um século de atividade. Ex: Fed – 1913 (103 anos); Banco da Inglaterra - 1694 (323 anos) e Banco do Japão – 1882 (135 anos);

  • Pouco tempo de autonomia: Apesar de sua criação ser datada de 1964, o BC tinha muitas de suas atividades divididas com o Banco do Brasil e até com os bancos estaduais e o Tesouro. Apenas com a constituição de 1988 começaram a ser criados mecanismos que garantissem ferramentas para que o BC fosse o banco dos bancos, mas sua atuação como o banco dos bancos é considerada como plenamente autônoma apenas a partir da década de 1990[iii];

  • Histórico de alta inflação: O histórico da economia brasileira de convivência com a inflação também pode ser considerado como um fator para a desconfiança dos agentes quanto ao comprometimento da autoridade monetária no combate à inflação. O Brasil é o recordista mundial de tempo de convivência com alta inflação.

Conforme podemos ver acima, a política monetária pode estar sujeita, muitas vezes, a problemas institucionais e históricos que causam sensibilidade do mercado quanto a seu comportamento. Os vários anos de inflação vividos pelo Brasil, por mais que agora pareçam um pesadelo antigo, ainda estão vivos na “memória” do mercado.

Portanto, o medo que tais mazelas retornem faz com que o Banco Central tome muitas decisões ortodoxas, pois, apesar de termos controlado o monstro da inflação, muitos dos nossos outros problemas econômicos não foram (nem um pouco) resolvidos.

Notas:

[i] Para mais detalhes, ver sobre Expectativas Adaptativas e Racionais.

[ii] https://www3.bcb.gov.br/expectativas/publico/consulta/serieestatisticas

[iii] (Franco, 2016)

Bibliografia:

Bernanke , B. S., & Mishkin , F. S. (1997). Inflation targeting: A new framework for monetary policy?

Franco, G. H. (2016). O Conselho Monetário Nacional como autoridade monetária: das origens aos dias atuais. Em A crise fiscal e monetária brasileira (pp. 39-66).

Jaloretto, C. (2016). Banco Central do Brasil: evolução histórica e questões atuais. Em A crise fiscal e monetário brasileira (pp. 67-86).

Kydland, F. E., & Prescott, E. C. (1977). Rules Rather than discretion: The inconsistency of optimal plans.

 
 
 

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