O que é Economia Ecológica?
- Paulo Gonzaga M. de Carvalho
- 13 de out. de 2017
- 4 min de leitura
“Descobrimos, porém, que a ciência também pode produzir ignorância, pois conhecimento fecha-se na especialização”
Morin e Kern

Sem dúvida “economia ecológica” é uma expressão meio estranha. Podia ser pior, pois foram cogitados outros “nomes de batismo”: “ecologia econômica” e “ecologia e economia” e até “econologia” e “ecolonomia” (Costanza, R. 1989). Se o nome escolhido tivesse sido um desses dois últimos, ninguém iria entender do que se tratava. Seria talvez como alguns remédios, só lendo a bula. A expressão adotada (economia ecológica) dá uma indicação certa, pois trata-se de algo que tem a ver com a economia e com a ecologia. Simultaneamente guarda uma imprecisão, pois parece que economia ecológica é um ramo da economia. Afinal não existe economia do trabalho e economia da saúde? Seria então um sinônimo de economia do meio ambiente, um ramo da economia já bem estabelecida? A economia ecológica não é um ramo da economia consequentemente, não é a mesma coisa que economia do meio ambiente.
Segundo Costanza (1989 a economia ecológica é a área de estudo voltada para análise das relações entre ecossistemas e sistemas econômicos no sentido amplo. Portanto, é mais do que simplesmente aplicar o instrumental (neoclássico) da economia a temas ambientais. Mesmo porque a economia do meio ambiente já faz isso. A grande diferença entre economia ecológica e economia do meio ambiente não está tanto no “estudar as relações entre ecossistemas e sistemas econômicos” e sim na qualificação “num sentido amplo”. Essa expressão - “num sentido amplo” – pode parecer um pouco vaga mas expressa o compromisso da economia ecológica com uma visão holística. Esse é o grande diferencial. Para entendermos como se chegou à necessidade de se criar uma nova área de estudo, e não uma nova disciplina, nada como um pouco de filosofia (ex: reducionismo), economia (ex: externalidades), da ecologia (ex; ecossistemas, capacidade de suporte), da teoria de sistemas (ex: sistemas complexos) e física (ex: leis da termodinâmica).
A economia neoclássica não ignorou totalmente o meio ambiente, tanto que surgiu, mas só nos anos sessenta/setenta, um novo ramo dentro da economia, o da economia do meio ambiente e dos recursos naturais Um conceito chave desse novo ramo da economia é o de externalidade. Existe externalidade quando um o dano (ou benefício), causado por agente econômico em outro, não se expressa no sistema de preços. A poluição dos recursos hídricos prejudica o produtor de bebidas e nem por isso a água é mais barata ou o produtor recebe algum tipo de indenização. Entretanto essa inclusão do meio ambiente foi parcial e fragmentária. Ou seja, estudar a externalidade causada pela poluição do ar, da água, do solo etc. sempre de forma separada e isolada. Outras características da economia neoclássica, criticadas pela economia ecológica, são o otimismo tecnológico (vide Solow), que solucionaria qualquer problema de escassez de recursos naturais e não o questionamento da distribuição inicial de recursos entre classes e países e o fato de minimizar a questão da distribuição de recursos entre as gerações.
Existem diferenças, mas também pontos de contato entre a economia ecológica e a economia ambiental (mainstream neoclássico). A economia ecológica trata de três problemas básicos (Constanza et all 1997): alocação, distribuição e escala e consequentemente tem três objetivos interdependentes: escala sustentável, distribuição justa e alocação eficiente. A economia neoclássica trata extensivamente da alocação, secundariamente da distribuição, mas não leva em conta a escala. O tema escala aborda na economia ecológica a questão da capacidade de suporte da natureza, portanto, de seus limites físicos. Esse tema é o que diferencia a economia ecológica da economia neoclássica, mesmo porque boa parte da abordagem neoclássica ao tema alocação – um assunto essencialmente neoclássico – é incorporado pela economia ecológica, que é pluralista. Como a economia ecológica é um campo de estudo pluralista, ela pode ao mesmo tempo criticar os fundamentos da economia neoclássica e mesmo assim incorporar suas contribuições ao estudo dos problemas ambientais. Mas essa incorporação se dá de forma crítica e em bases diferentes. Esse pluralismo pode ser interpretado como um problema ou limitação da economia ecológica, que por causa disso não teria uma “base teórica sólida”. Mas sem pluralismo, não é possível analisar as complexas relações entre economia e ecologia.
A economia ecológica, portanto, é um campo de estudo e não uma disciplina. Segundo Ropke (2005) a ECOECO têm um corpo de ideias centrais e talvez a mais importante seja a crença na existência de limites físicos ao crescimento dados pela capacidade da natureza de fornecer insumos e energia e reciclar resíduos. O entendimento da questão ambiental só é possível com uma abordagem transdisciplinar. Portanto, o pluralismo é imprescindível dada nossa ignorância básica sobre as interações entre o homem e o meio ambiente. Como essas interações são complexas, só podem ser pensadas por uma abordagem sistêmica que leve em conta a equidade e distribuição de bem-estar na geração atual e entre a geração atual e as próximas gerações. A natureza tem um valor em si e que a economia está imersa num amplo sistema social e cultural e, portanto, natureza, economia e sociedade e cultura evoluem de forma conjunta, ou seja, coevoluem.
Essas ideias centrais nos levam a várias questões, que são, na verdade, campos de pesquisa: Como medir o bem-estar? Como levar em conta de forma adequada as demandas das próximas gerações? Em que medida os limites físicos impostos pela natureza podem ser superados pelo progresso técnico? Em que medida o crescimento econômico e a globalização contribuem ou não para sustentabilidade da sociedade? Como abordar o tema das mudanças climáticas num enfoque transdisciplinar?
Costuma-se encerar com conclusões. Não é caso daqui, que termina com perguntas.
* Paulo Gonzaga M. de Carvalho é professor de Economia da Universidade Estácio de Sá, economista do IBGE e diretor da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica (ECOECO).
Bibliografia
Costanza, R. (1989) What is Ecological Economics ? Ecological Economics 1 (1989) disponível em http://www.uvm.edu/giee/publications/Costanza_EE_1989.pdf
Costanza, R., Cumberland, J., Daly, H, Goodland, R. e Norgaard, R. (1997) An Introduction to Ecological Economics (e-book) disponível em http://www.eoearth.org/article/An_Introduction_to_Ecological_Economics_%28e-book%29
Ropke, I. (2005) Trends in the development of ecological economics from the late 1980s to early 2000s em Ecological Economics, Stanford Encyclopedia of Philosophy (2009) Ecology
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