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Agenda de reformas: Abertura Comercial

  • Jonathan William
  • 22 de jan. de 2018
  • 7 min de leitura

Atualmente, grande parte do debate econômico gira em torno das reformas propostas pelo Governo de Michel Temer. Neste contexto, são debatidas as possíveis reformas tributária, política, previdenciária e a já aprovada reforma trabalhista. Segundo o Governo, tais reformas são essenciais para garantir o equilíbrio fiscal, modernizar o ambiente de negócios, reduzir ainda mais o Risco-Brasil e proporcionar um crescimento longevo e mais sustentável. Apesar do caráter reformista do atual Governo, as discussões sobre reformas na política comercial brasileira visando uma maior inserção do país no comércio mundial são poucas e irrelevantes se comparada às outras reformas. Ao contrário de diversos países em desenvolvimento, após 1994 o Brasil não avançou no processo de liberalização comercial iniciado no final da década de 80 e atualmente configura-se como uma das economias mais fechadas do mundo.

Por que uma Abertura Comercial pode ser benéfica para o Brasil?

Existem benefícios claros advindos da inserção da economia brasileira no comércio mundial. Com menores barreiras às importações de bens intermediários e bens de capital, uma das primeiras consequências seria a redução do hiato tecnológico através da incorporação de tecnologias presentes na fronteira internacional de produção ao processo produtivo das empresas localizadas no país. Outra consequência é a seleção natural de empresas mais produtivas, ocasionada por uma realocação dos recursos produtivos de firmas ineficientes para firmas mais produtivas e eficientes, processo possibilitado por um mercado mais competitivo com a redução das reservas de mercado. Em um mercado competitivo as empresas são naturalmente incentivadas a buscar inovações tecnológicas e melhores métodos de produção para garantir o crescimento de sua produtividade e evitar a redução de seus retornos esperados. Baseando-se na teoria clássica do comercio internacional, haverá ganhos advindos da especialização do país em setores onde possui vantagens comparativas.

Mas nem tudo são flores, pois os impactos positivos de uma liberalização comercial normalmente são observados em um período de longo prazo e nem sempre correspondem às expectativas. Tudo isso ocorre por diversos motivos, mas é principalmente porque existe uma inércia alocativa dos recursos. Dependendo do ritmo e do método utilizado na liberalização, no curto prazo será observado não só aumento no consumo de produtos importados, mas também haverá desemprego e falência de diversas empresas (que é algo positivo apenas no longo prazo), e é possível que a realocação de recursos demorem demais ou até mesmo não aconteça, pois determinados setores pressionarão o governo a manter seus benefícios do período pré-liberalização, fazendo com que os ganhos esperados de produtividade não se realizem, por isso os impactos negativos observados no curto prazo podem gerar o abandono do processo de liberalização.

Diversas publicações relacionam os efeitos da liberalização comercial no crescimento econômico dos países. Em 2013 Estevadeordal e Taylor (2013) [1] concluíram que países onde ocorreram processos de liberalização econômica mais intensos cresceram mais que países que não reduziram suas tarifas de importações, principalmente por terem reduzido as barreiras de importações de bens de capital e bens intermediários, induzindo inovações e maior eficiência produtiva.

Todos esses fatores podem contribuir com o aumento da produtividade em diversos setores, especialmente no setor industrial, que em 2013 apresentou uma redução da produtividade em R$1,23 por hora comparado a 1995[2]. O processo de desindustrialização da economia brasileira não pode ser creditado à ausência de programas de política industrial, pois desde 2004 diversos planos fracassaram em seu objetivo. PITCE (Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior), PDP (Política de Desenvolvimento Produtivo), PBM (Plano Brasil Maior) e INOVAR AUTO (Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos). Todos esses programas de Política Industrial foram caracteristicamente nacional-desenvolvimentistas, com protecionismo exacerbado e benefícios a grandes produtores nacionais, medidas como: exigências mínimas de conteúdo local, incentivos fiscais e creditícios a quem cumprisse um determinado grau de conteúdo nacional, proteção contra importações e principalmente, a partir de 2008, extraordinárias concessões de crédito subsidiado via BNDES. Além de todos esses incentivos não corresponderem às expectativas dos antigos governos, ficou bem claro que em grande parte foi uma transferência de renda às avessas, dos mais pobres para os ricos. Os fracassos desses programas demonstram a necessidade de execução de uma política industrial alternativa ao já costumeiro protecionismo.

O grau de abertura da Economia brasileira comparado a outros países

Analisar o grau de abertura de uma determinada economia não é tão simples. Alguns detalhes, como fatores geográficos, dificultam a análise da inserção de um país no comércio mundial, demonstrando que o grau de abertura da economia mensurado não depende exclusivamente da Política Comercial. Na literatura econômica, um dos principais indicadores utilizados para demonstrar o grau de abertura de uma economia é o fluxo de intercâmbio de bens como proporção do Produto Interno Bruto(PIB), ou seja, a razão entre a soma das exportações(X) e importações(M) e o PIB. Utilizando esse indicador, se compararmos o Brasil com outros países em desenvolvimento, veremos que na razão (X+M/PIB) o Brasil fica bem abaixo dos demais países.

Fonte: Banco Mundial https://data.worldbank.org/

*Últimos dados disponíveis são de 2014

Note que o gráfico acima também inclui os Estados Unidos, inclusive atrás da Venezuela, demonstrando uma fragilidade do índice. É comum utilizarem os Estados Unidos como grau de comparação para demonstrar que o indicador não leva em consideração o tamanho das economias e, portanto, o desempenho do Brasil seria comum devido a grandeza de sua economia. Mas vale ressaltar que além de os Estados Unidos terem o maior PIB nominal do mundo, eles também são os maiores importadores mundiais e segundo maiores exportadores, enquanto o Brasil é a 9° maior economia do mundo, mas apenas o 25° maior país exportador e 29° importador.[3]

Ainda em relação à razão (X+M)/PIB, podemos notar que o Brasil tem a pior colocação entre todos os países do G20.

Fonte: Banco Mundial https://data.worldbank.org/

No banco de dados do Banco Mundial também é possível conferir que em 2016 a razão importações/PIB do Brasil foi de apenas 12,1%, a pior colocação entre os 160 países considerados no ranking.

O Brasil tem ínfima participação nas Cadeias Globais de Valor, a participação das importações no valor adicionado das exportações de manufaturas em 2011 foi de apenas 14,3%, segundo pior desempenho entre 61 países. O baixo desempenho é comum à economias fechadas, o Brasil junta-se a Arábia Saudita, Argentina, Colômbia, Indonésia e Rússia, todos com participação inferior à 20%. [4]

O Brasil estagnou nas políticas de reduções tarifárias

No final da década de 80 e início dos anos 90 ocorreram processos de liberalizações econômicas com ênfase em reduções tarifárias em diversos países, incluindo o Brasil. Ainda que timidamente, no Brasil as liberalizações iniciaram-se no fim da década de 80, com a eliminação de redundâncias tarifárias e redução da média da tarifa nominal que era de 57,5% e passou a ser 32%. No início dos anos 90 o processo de liberalização intensificou-se com a extinção de regimes especiais de importação herdados do início do Processo de Substituição de Importações, eliminação de barreiras quantitativas e com o estabelecimento de que as alíquotas de importações deveriam variar entre 0% e 40%, com moda de 20% e média de 14,8%. Em 1994 ficou acordado a Tarifa Externa Comum do Mercosul, onde a alíquota máxima estabelecida seria 20%, a moda 10% e a média 12%. Porém, em 1995, temendo as possíveis fugas de capitais consequentes do Efeito Tequila, crise econômica que abalou o México em 1994, o Mercosul retrocedeu parcialmente no processo de liberalização, elevando a Tarifa Externa Comum em 3 pontos percentuais, pois os principais países do bloco (Argentina e Brasil) passavam por ajustes macroeconômicos com utilização do regime de âncoras cambiais. Como consequência, no Brasil a tarifa média elevou-se de 11,2% em 1994 para 13,4% em 1996.

Após 1996 não há avanços significativos na política tarifária brasileira, contrastando com outros países em desenvolvimento. No gráfico abaixo podemos observar como o Brasil estagnou e que é o único país entre os selecionados que em 2015 tinha uma alíquota média superior à de 1996.

Elaboração: Lia Baker Valls Pereira

Outro gráfico interessante a ser analisado é sobre as alíquotas médias sobre bens intermediários. Como dito antes, um dos grandes benefícios da liberalização comercial é a possibilidade de acesso a novas tecnologias e bens de capital a preços reduzidos no mercado internacional.

Entre os países selecionados, o Brasil foi um dos que mais reduziu a média das alíquotas sobre bens intermediários, ficando atrás apenas da Índia. Porém, vale ressaltar que em 1989 a média das alíquotas indianas eram muito superiores as brasileiras e em 2014 já é quase a metade. Em 2014 o Brasil tem uma média considerada alta para os padrões globais atuais, sendo a mais elevada entre os países selecionados.

Além de estagnar na redução tarifária após 1996, a partir de 2008 inicia-se a intensificação das barreiras não tarifárias, como as exigências de conteúdo local, contrariando a necessidade brasileira de continuidade do processo de liberalização.

Conclusão:

O Brasil deu passos importantes ao iniciar um processo de liberalização econômica no período 1987-1994, porém, contrariando a tendência entre os países em desenvolvimento, tal processo foi abandonado e a política tarifária estagnou-se. Nos anos 2000 a política econômica brasileira tendeu ao protecionismo através dos planos de política industrial, fazendo com que o Brasil tenha perdido uma janela de oportunidades ao não ter se integrado mais ao comércio mundial.

Tendo em vista a popularidade dos debates sobre as reformas essenciais para o Brasil, esse é o melhor momento para intensificar as discussões acerca da reformulação das políticas comerciais e industriais brasileiras, visando obter ganhos de produtividade advindos da redução do hiato tecnológico e de um mercado mais competitivo e transparente.

Referências Bibliográficas:

[1] ESTEVADEORDAL, A., and A. M. Taylor. “Is the Washington Consensus Dead? Growth, Openness, and the Great Liberalization, 1970s–2000s.” Review of Economics and Statistics 95 (December 2013): 1669–90.

“The level of GDP per worker is shown relative to the baseline trend for each group during the 1975–89 “before” period. Liberalizers clearly accelerated, whilst nonliberalizers stagnated. After 15 years, the difference between the two is about 15%–20%, implying a differential acceleration of about 1% per annum in favor of the liberalizers”.

[2] Veloso, F. Matos, S. e Coelho, B. “Produtividade do Trabalho no Brasil: uma Análise Setorial.”. Ensaios IBRE de Economia Brasileira. Rio de Janeiro, Elsevier. 2015.

[3] CIA The World Factbook https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/

[4] http://stats.oecd.org/Index.aspx?DataSetCode=TIVA_2016_C1

BACHA, E. Integrar para crescer: o Brasil na economia mundial. In: VELLOSO, J.

P. R. Visão do Brasil: Estratégia de crescimento industrial, com maior inserção internacional e fortalecimento da competitividade. Rio de Janeiro: Fórum Nacional, 2013.

p.47-65.

BACHA, E. Integrar para crescer 2.0. In: VELLOSO, J. P. R. Investindo contra a crise e procurando voltar a crescer. Rio de Janeiro: Fórum Nacional, 2016. p.65-73.

CINDES – Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento - A integração internacional da economia brasileira: Propostas para uma nova política comercial, 2016.

PEREIRA, Lia Valls. O Brasil é uma economia fechada? Revista Conjuntura Econômica, Rio de Janeiro, Vol. 71 nº 1, p. 56-59, 2017.

PINHEIRO, Armando Castelar e GIAMBIAGI, Fabio. Rompendo O Marasmo: A Retomada Do Desenvolvimento No Brasil. Elsevier, 2006.

 
 
 

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